PROBLEMA: Suspensão do fornecimento de energia elétrica sem aviso prévio, débitos em nome do locatário anterior.

30/01/2021

SOLUÇÃO: Débito do antigo usuário não pode imputado ao atual consumidor do serviço.

Muitos imóveis apresentam inconsistências quanto ao titular da fatura de energia: gente que mora ou que trabalha na unidade consumidora, mas a conta de energia está "no nome" do proprietário, antigo ou atual, ou mesmo de um antigo inquilino, às vezes até com contas a pagar. Considerando a essencialidade que a energia elétrica possui para o convívio em sociedade e bem-estar dos cidadãos, a suspensão do seu suprimento deve ser considerada medida extrema, sobretudo pela agressividade a ela inerente, restando caracterizado o dano moral indenizável pelo corte do fornecimento antes do vencimento da fatura. O presente estudo se propõe a analisar as hipóteses de possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica por parte das concessionárias de serviço Público. A abordagem será realizada sob a ótica da legislação, inclusive, da Resolução 414 da ANEEL, assim como, da jurisprudência. Notadamente, a suspensão do fornecimento de serviços públicos essenciais, a exemplo da energia elétrica, é tema bastante delicado, tendo merecido, ao longo dos anos, atenção especial da legislação, doutrina e jurisprudência, mormente por ser questão imbricada a própria dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil. Nesta senda, nada obstante ser ponto pacífico na jurisprudência a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica em razão do inadimplemento das faturas relativas ao consumo, na doutrina há viva discussão sobre a legalidade e a legitimidade do referido ato.

A transferência de titularidade não enseja a troca da propriedade. Na verdade, este procedimento só pode ser feito se o novo titular já possui legalmente a propriedade sobre o imóvel ou se, em caso de inquilinato, apresenta o contrato de locação com vigência atual - diretamente com o proprietário ou com a imobiliária. Outra opção seria notificar a concessionária para transferir a energia para o nome dos locatários, mas para isso você terá que ter uma cópia do contrato de locação. Se a concessionária não promover a transferência (o que provavelmente ocorrerá), pode-se ajuizar uma ação de obrigação de fazer. Mas sua legitimidade poderá ser contestada, já que o mais correto, a meu ver, seria pedir o desligamento. Leia a resolução 456/00 da ANEEL, em especial o artigo 4º, § 2º, que confere responsabilidade pessoal à ligação de energia. Por fim, se você preferir deixar como está, havendo inadimplência por parte dos locatários e inscrição do seu CNPJ no SERASA, caberá ação indenizatória por danos morais corta os locatários.

Estando em discussão o débito correspondente à diferença de consumo apurada unilateralmente pela concessionária do serviço de energia elétrica, não deve ocorrer a suspensão do fornecimento. Neste sentido, impende destacar que o artigo 175 da Constituição Federal atribui ao Poder Pública a incumbência de prestar os serviços públicos, podendo fazê-lo diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, conforme disposição legal. Visando regular a matéria atinente ao regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, fora editada a Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. A referida lei, em seu artigo 6º, assevera que toda a concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários. Mais adiante, a própria lei indica que serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas. Em síntese, os princípios do serviço público estão estabelecidos no artigo 6º, §1º da Lei nº 8.987/95. Dentre estes princípios, o que mais interessa ao nosso estudo é o princípio da continuidade, que será esmiuçado no tópico seguinte. Outra premissa básica necessária ao estudo em epígrafe é a de que a prestação de serviços públicos em prol da pessoa física ou jurídica pode caracterizar-se como uma relação do consumo, submetida, portanto, as regras do Código de Defesa do Consumidor.

Há quem prefira quitar as dívidas para se livrar da pendência, entretanto a obrigação de restabelecer o serviço, independentemente do pagamento do antigo morador, não é sua, mas sim da concessionária de energia e de água. Dessa forma, a distribuidora não pode condicionar o fornecimento de energia e água ao pagamento de débito não autorizado pelo consumidor ou de débito pendente em nome de terceiros, exceto quando ocorrem as seguintes situações: I - a distribuidora comprovar a aquisição por parte de pessoa jurídica, à exceção das pessoas jurídicas de direito público e demais excludentes definidas na legislação aplicável, por qualquer título, de fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional; II - continuidade na exploração da mesma atividade econômica, sob a mesma ou outra razão social, firma ou nome individual, independentemente da classificação da unidade consumidora. Ainda de acordo com o artigo 128 da Resolução 414/2010 da Aneel, "quando houver débitos decorrentes da prestação do serviço público de energia elétrica, a distribuidora pode condicionar à quitação dos referidos débitos a ligação ou alteração da titularidade solicitadas por quem tenha débitos no mesmo ou em outro local de sua área de concessão". Logo, a distribuidora não pode negar a você a transferência da titularidade da unidade consumidora ou exigir o pagamento de débito relativo a período em que a unidade consumidora não estava sob sua responsabilidade. Também é importante analisar que a obrigação contratual entre o locatário e a concessionária é personalíssima - ou seja, dessa forma, não poderá ser transferida a você. Segundo o artigo 23, inciso VIII, da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.2451/91), as despesas anteriores de telefone e de consumo de luz, gás, água e esgoto devem ser pagas pelo antigo morador. Vale ressaltar que entre o locador e o locatário não existe relação de consumo, mas uma relação civil. Isso porque a lei considera que as partes do contrato de locação conseguem negociar os termos do contrato em pé de igualdade. Já entre o locador e a concessionária de energia ou a imobiliária, por exemplo, há sim uma relação de consumo, em virtude da prestação de um serviço público essencial - no caso, a distribuição de energia elétrica e de água.

Ressalte-se, por oportuno, que o artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor trata justamente sobre a prestação de serviços públicos diretamente pelo Poder Público ou por meio de concessionárias e permissionárias, salientando que os serviços públicos essenciais devem ser contínuos. Além de um serviço público prestado de forma contínua, o consumidor tem direito que o serviço seja prestado de forma eficaz e adequada da, conforme dispõe o artigo 6º, X do CDC. Feitas estas considerações, tendo citado que o fornecimento de energia elétrica é um serviço público e, como tal, a sua prestação deverá observar determinados princípios norteadores, passaremos a analisar de forma minudenciada o princípio da continuidade do serviço público.

Exceto serviços emergenciais (falta de energia, cabo partido, etc.), que trazem risco ou prejuízo para a comunidade, todos os outros procedimentos relativos ao fornecimento só podem ser acionados pelo titular da fatura da unidade consumidora. Conforme asseverado em parágrafos anteriores, a Lei 9.427/96 instituiu a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), assim como, apresentou regramento acerca da concessão do serviço de fornecimento de energia elétrica. No caso específico da ANEEL, há de se ressaltar, que figura como poder concedente em contratos de concessão dos serviços públicos de fornecimento de energia elétrica. Proprietário de imóvel não é responsável pela dívida do antigo inquilino. A decisão é da 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que declarou inexigível o débito em nome da dona do imóvel e determinou que seja restabelecido o fornecimento de água pela Corsan - Companhia Riograndense de Saneamento. Cabe recurso. A proprietária alegou que não era responsável pela dívida, no valor de R$ 1 mil, relativa ao consumo de água no período em que o imóvel estava alugado. Na Justiça, também pediu Tutela Antecipada para que o serviço de fornecimento de água não fosse suspenso. Para o desembargador Marcos Aurélio Heinz, não se pode exigir o pagamento da dívida da proprietária, já que o imóvel estava locado na época. Acompanhou o voto a desembargadora Liselena Schifino Robles Ribeiro. O relator, desembargador Francisco José Moesch, ficou vencido. Para ele, como a obrigação incide sobre o imóvel e não sobre pessoas, é a autora, proprietária do imóvel, também responsável pelo pagamento da dívida, ainda que o débito seja referente ao período em que o imóvel estava locado.

Iniciaremos este tópico tratando sobre a necessidade de aviso prévio para efetivação da suspensão do serviço de fornecimento de energia elétrica. Neste particular, a própria lei prevê a necessidade de aviso prévio para efetivação da suspensão ou interrupção dos serviços de fornecimento de energia elétrica. Nada obstante, os Tribunais foram instados, em diversos casos, a apontar se a ausência de aviso prévio, mesmo nos casos de inadimplência comprovada, geraria ilegalidade do ato. E não foi outra a posição do STJ senão decretar a ilegalidade da suspensão do fornecimento de energia elétrica sem que tenha ocorrido o aviso prévio, mesmo ante a existência de débito (REsp 1.306.356). Neste sentido, o número restrito de hipóteses nas quais é legal a suspensão do fornecimento de energia elétrica se deve ao fato de o gozo dos serviços públicos essenciais ser intimamente ligado a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da república federativa do Brasil. Dentro deste contexto, basta analisar o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, no que se refere à impossibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica dos consumidores que sobrevivem em estado de miserabilidade, ainda que haja inadimplência no que tange ao pagamento das faturas. Conforme exposto no deste trabalho. Por fim, impede salientar que por se tratar de estudo que envolve a jurisprudência acerca de determinada matéria, existe grande possibilidade de se tornar defasado, ante a prolação de novas decisões por parte dos tribunais.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Suspensão do fornecimento de energia elétrica à unidade consumidora, com indícios de corte sem aviso prévio, sendo que os débitos estão em nome do locatário anterior e não do atual usuário ou proprietário. A João Neto Advocacia realiza abertura de processo contra concessionarias de força e luz, pelos cortes e cobranças indevidas de seus clientes. Débito do antigo usuário não pode ser imputado ao atual consumidor de serviço.

João Neto

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FONTES:

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