PROBLEMA: Servidor Público tem doença incapacitante e tem descontado o Imposto de Renda.

12/05/2020

SOLUÇÃO: Servidor pode pedir a restituição do imposto desde o momento em que foi evidenciada a incapacidade.

O Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza é um dos tributos instituídos pela União Federal, previsto na Constituição Federal, em seu artigo 153, inciso III. No Código Tributário Nacional, tem previsão no artigo 43.De forma resumida, é um imposto que incide sobre todo acréscimo patrimonial, como resultado do investimento do capital, do trabalho ou da combinação de ambos. O IRPF tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade de renda e proventos, que resultam em um aumento no patrimônio do contribuinte. Ao contrário das empresas, que são tributadas com base num balanço realizado periodicamente, dependendo da modalidade de tributação adotada, as pessoas físicas apuram a renda que se sujeitará ao Imposto de Renda durante um determinado ano, através da declaração de ajuste anual. Apesar de o imposto ser devido mensalmente (artigo 2º da Lei 7.713/1988), a base de cálculo do tributo será ajustada com a declaração e o montante de rendimentos e proventos de qualquer natureza apurado entre 1º de Janeiro e 31 de Dezembro de cada ano. O Imposto de Renda é um dos tributos mais complexos existentes em nosso país. Para não nos afastarmos do tema deste artigo, não nos aprofundaremos em todas as suas características, como a possibilidade de dedução de despesas e gastos autorizados (despesas médicas, por exemplo), a progressividade das suas alíquotas, a generalidade de contribuintes, a universalidade de renda, a definição mais apurada do que significa renda e proventos de qualquer natureza, entre outras. Muitos aposentados nos questionam sobre a isenção do imposto de renda em seu benefício, por razão de estar acometido de doença grave. A isenção é garantida por lei e visa aliviar os encargos financeiros enquanto o aposentado se trata da doença, uma sensibilidade estatal com àqueles que passam por um momento de dificuldade de saúde que pesa em seu orçamento, pelos custos de medicamentos, deslocamentos para hospitais, dentre outros. Consideram-se isentos de IR os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional (benefícios previdenciários decorrentes de acidente de trabalho) e, ainda, aos portadores das seguintes doenças: a) AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida)b) Alienação Mental c) Cardiopatia Grave d) Cegueira (inclusive monocular)e) Contaminação por Radiação f) Doença de Paget em estados avançados (Osteíte Deformante) g) Doença de Parkinson h) Esclerose Múltipla i) Espondiloartrose Anquilosante j) Fibrose Cística (Mucoviscidose) k) Hanseníase l) Nefropatia Grave m) Hepatopatia Grave n) Neoplasia Maligna o) Paralisia Irreversível e Incapacitante p) Tuberculose Ativa.

A isenção de Imposto de Renda a servidores públicos acometidos por moléstia grave é tema recorrente no Poder Judiciário. O motivo de tantas demandas deve-se ao fato de que o inciso XIV do artigo 6º da Lei 7.713, de 1988, que concede o benefício fiscal expressamente a trabalhadores aposentados, não é claro no que se refere àqueles que possuem as mesmas doenças descritas no rol, mas permanecem em atividade.Com efeito, o referido dispositivo legal dispõe que são isentos de Imposto de Renda os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa e neoplasia maligna, dentre outras. Ou seja, a lei isenta de tributação os proventos de aposentadoria de pessoas afligidas por alguma das doenças lá descritas. Em razão disso, para os servidores públicos (e trabalhadores em geral) que possuem qualquer das moléstias citadas na lei, mas permanecem exercendo suas atribuições, a administração tributária não aplica o benefício da isenção, sob a justificativa de que estaria respaldada pelo princípio da literalidade (artigo 111 do Código Tributário Nacional), segundo o qual a legislação tributária que disponha sobre normas de isenção deve ser interpretada restritivamente, não sendo possível interpretação extensiva para elastecer a benesse. No que tange aos servidores públicos federais, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região vem acolhendo em diversas demandas a tese de que a isenção do Imposto de Renda deve alcançar não apenas os aposentados, mas também os servidores ativos. Em sentido contrário, o Superior Tribunal de Justiça ainda não ampliou sua interpretação legal, permanecendo com uma interpretação restritiva da matéria quanto à impossibilidade de se conceder a isenção justamente em razão do princípio tributário da literalidade e da separação dos Poderes, pois, segundo a corte, ao reconhecer a tese, os tribunais estariam legislando (REsp 1.059.290/AL e REsp 1.243.165/PR).Ocorre que, se observado o objetivo do legislador que concedeu a isenção por meio da Lei 7.713/88, bem como a evolução da medicina, o entendimento de que também os servidores ativos acometidos por alguma das doenças descritas no rol devem ser isentos da tributação do Imposto de Renda é medida que se impõe.

Cuida-se de isenção fiscal subjetiva, posto que concedida em razão das condições pessoais do beneficiário que se enquadre num dos dispositivos legais acima. Justamente pelo seu caráter subjetivo, as moléstias profissionais são excluídas da disposição relativa aos pensionistas, aplicando-se, tão-somente, em relação aos instituidores das pensões, ou seja, os aposentados em razão de moléstias adquiridas em razão da prestação de serviço. Natural, posto que o benefício, no que tange às moléstias profissionais, busca alcançar aqueles que se tornaram inativos face às doenças decorrentes do trabalho, o que não ocorre com os pensionistas, que são beneficiários. Seja como for, por incrível que pareça, o benefício fiscal em questão é, ainda, um ilustre desconhecido de milhares de pessoas, especialmente vinculadas ao regime geral da previdência social, beneficiários da previdência privada, além dos servidores públicos aposentados, integrantes de um dos regimes próprios de previdência social (União, Estados, Distrito Federal e Municípios, além das entidades da administração indireta).Isso porque somente é relativamente acessível a informação do direito à isenção em epígrafe no momento inicial da concessão do benefício, quando todas as atenções do potencial beneficiário estão voltadas à obtenção da aposentadoria/pensão e, no caso dos aposentados, ainda há o concurso do apoio da estrutura sindical que, dentre outras coisas, de uma maneira geral, presta o auxílio necessário. Tal não se dá, entretanto, quando a moléstia profissional ou doença grave relacionada na lei aparecem tempos depois da concessão do benefício previdenciário. Mesmo superveniente, o infortúnio da doença dá sim direito à isenção, nos termos do dispositivo legal acima, e muitos cidadãos, nesta delicada situação não têm conhecimento de seu direito ou de como devem proceder. As instituições do Estado não cumprem, como deveriam, seus deveres de prestar informação a respeito da benesse. A isenção adota, como elemento justificador, a patologia, com amparo na redução ou perda da capacidade contributiva, direito em que, na visão de Carnelutti, por ser tão óbvio, não deveria ser discutido em juízo: "Os romanos denominavam a atividade do advogado no processo com o verbo "postular". Dizem os léxicos que esse verbo significa pedir aquilo que se tem direito de ter. E isso é o que agrava o peso de pedir. Não se deveria ter necessidade de pedir aquilo que se tem direito de ter. (Carnelutti, Francesco. As Misérias do Processo Penal. Ed. Leme CL EDIJUR, 2013. P. 28).A literalidade do inciso IV do artigo 6º da Lei 7.713/88 afirma claramente que, dentre os rendimentos percebidos por pessoas físicas, são isentos os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, e demais doenças especificadas em lei. Não se trata de interpretação extensiva da norma de isenção de imposto de renda, mas sim de uma interpretação sistemática e de acordo com a finalidade social da lei, que é a de aumentar, com a isenção, a capacidade financeira do trabalhador para amainar os sofrimentos decorrentes das doenças de que é vítima. Essa finalidade social é pressuposto de interpretação de toda e qualquer norma, conforme determinação prevista na Lei de Introdução de Normas do Direito Brasileiro: Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. A visão moderna atribuída pelo magistrado, acobertada pelo princípio da dignidade da pessoa humana, consolidado mediante a prevalência do outro princípio constitucional entrelaçado, a isonomia, ambos, com caráter de direitos fundamentais, autorizam o Poder Judiciário conceder a isenção tributária a todos os trabalhadores portadores de patologias incapacitantes, ainda que estejam em atividade.

De fato, como se pode depreender da exposição de motivos do projeto de lei, o intuito do legislador ao isentar aqueles acometidos por moléstia grave foi mitigar o sofrimento e o dispêndio de recursos dessas pessoas em razão do tratamento de que necessitam, em conformidade com os ideais da Constituição de 1988, publicada no mesmo ano da Lei 7.713, não havendo motivo para diferenciar os ativos dos inativos. E, o princípio da isonomia, expressamente citado na exposição de motivos, demonstra que a isenção deve alcançar a todos: "O princípio da isonomia fiscal tem o seu destaque ao ser enunciada a vedação do tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos". Essa seria a interpretação possível e que mais se adequaria à própria intenção do legislador ao estabelecer a isenção de Imposto de Renda, pois não há razão para se penalizar os trabalhadores em atividade e alcançar o benefício apenas aos aposentados. Entretanto, independentemente dos esforços interpretativos, merece enfoque o fato de que o contexto em que a Lei 7.713/88 foi aprovada era diferente do que vivenciamos atualmente, inclusive no que tange ao avanço da medicina, pois, à época de sua entrada em vigor, a aposentadoria era praticamente consequência que se impunha aos acometidos pelas doenças do rol legislativo, fato que vem se modificando com a evolução dos métodos de cura e de tratamento. Bem por isso é que a Procuradoria-Geral da República, na tentativa de elucidar de uma vez por todas qual deve ser o entendimento conferido à matéria, ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.025, na qual questiona o inciso XIV do artigo 6º da Lei 7.713. Para a PGR, deve ser reconhecida a inconstitucionalidade parcial sem redução de texto do referido dispositivo para declarar que, no âmbito de sua incidência, está incluída a concessão do benefício fiscal aos trabalhadores com doença grave que permanecem em atividade. Acertadamente, a Procuradora-Geral sustenta em seu pedido que a distinção entre trabalhadores ativos e aposentados que possuem as mesmas doenças graves fere os princípios da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da igualdade, além de desrespeitar as normas de proteção às pessoas com deficiência, proteção que deve ser vista de modo amplo para abranger também aqueles acometidos pelas moléstias graves descritas na Lei 7.713.Mais do que os preceitos constitucionais que são maculados na não extensão da isenção aos trabalhadores em atividade, tal diferenciação, nas palavras da PGR, "não está mais apoiada em fatores lógicos e objetivos que justifiquem o tratamento normativo diferenciado com relação aos rendimentos auferidos por pessoas que sofrem das mesmas doenças graves, mas que ainda permanecem exercendo atividade laboral".

Isso porque a aposentação era consequência impositiva àqueles que possuíam tais doenças graves, naquele contexto de três décadas atrás. Logo, a isenção aos inativos representava um meio de compensar as pessoas de sua perda ou redução da capacidade contributiva, além de garantir recursos financeiros para fazer frente às despesas com tratamento médico. Porém, com o avanço da medicina, ciência e tecnologia, nos dias de hoje, ainda que as pessoas venham a ser diagnosticadas com alguma das doenças graves da Lei 7.713, conseguem permanecer laborando concomitantemente ao tratamento. Não significa dizer, todavia, que os enfermos ativos não passem pelas mesmas dificuldades de tratamento e financeiras que aqueles que se aposentam. Essa indevida diferenciação fere de morte o princípio do valor social do trabalho, pois penaliza a pessoa pelo simples fato de conseguir permanecer trabalhando, mesmo doente. Chamando a atenção para esses aspectos, o desembargador federal Luciano Tolentino, no julgamento dos Embargos Infringentes 0009540-86.2009.4.01.3300 pelo TRF-1 (DJe 8/2/2013), classifica como uma monstruosidade que um contribuinte possa ser "sadio para fins de rendimentos ativos" e, simultaneamente, "doente quanto a proventos". Não se deve ignorar o princípio tributário da literalidade. Contudo, tal princípio não deve ser tratado de forma rígida e absoluta quando confrontado com o intuito do legislador ao editar a Lei 7.713, os princípios constitucionais da igualdade e dos valores sociais do trabalho, bem como a própria evolução da medicina, que permite atualmente que as pessoas que sofrem de alguma das doenças graves descritas no rol possam permanecer trabalhando. Espera-se, portanto, que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a ADI 6.025, o faça observando sua função precípua, a de ser o guardião da Constituição da República, e não permita que uma norma publicada no mesmo ano da Carta Magna de 1988 represente verdadeira afronta ao texto constitucional, por mero apego à literalidade.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Todas estas com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma (artigo 6º, inciso XIV, da Lei Federal nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com redação dada pelas Leis 8.541, de 23.12.1992 e 11.052, de 29.12.2004). Também estão isentos as complementações de aposentadoria, reforma ou pensão, recebida de entidade de previdência complementar, Fundo de Aposentadoria Programada Individual ou Programa Gerador de Benefício Livre e os valores recebidos a título de pensão em cumprimento de acordo ou decisão judicial, ou ainda por escritura pública e a prestação de alimentos familiares recebidos por portadores de moléstia grave. No âmbito administrativo é exigido para a isenção que o aposentado apresente atestado médico realizado por médico oficial, seja da União, Estado, Município ou Distrito Federal. Tal exigência da constatação ser realizada por perito oficial é o maior motivo de judicialização do tema, e o Superior Tribunal de Justiça aprovou a Súmula 598, fixando o entendimento da desnecessidade de apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial da isenção de Imposto de Renda, sendo o magistrado livre para apreciar a prova apresentada pelo contribuinte, podendo a doença grave ser provada por outros meios. Duas situações podem ocorrer quando o laudo pericial indica data retroativa em que a doença foi contraída e, após essa data, tenha havido retenção de imposto de renda na fonte e/ou pagamento de imposto de renda apurado na declaração de ajuste anual.

João Neto

Advogado

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