PROBLEMA: Liberação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para filhos autistas.

16/03/2019

SOLUÇÃO: Síndrome não esta no rol taxativo da Lei nº 8.036/1990, todavia o Poder Judiciário entende a possibilidade de liberação ao trabalhador.

A Lei 8.036/90 em seu artigo 20 expressa diversos casos nos quais restará possível movimentar-se a conta do trabalhador no FGTS, incluindo-se algumas doenças graves, tanto do trabalhador, quanto de seus dependentes. Inexiste previsão neste sentido quanto ao autismo. É notório que os cuidados e investimentos para o desenvolvimento e tratamento de crianças e adolescentes autistas são caros e contínuos, de modo que as terapias envolvidas se mostram essenciais para uma vida digna e de qualidade.

A lei prevê uma série de casos em que o trabalhador pode movimentar a sua conta do FGTS, como nas hipóteses de despedida sem justa causa ou para aquisição de moradia própria. Da mesma forma, é permitido o saque desses valores quando estivermos diante de diagnóstico de algumas doenças graves. Contudo, a lei não contemplou expressamente a previsão de saque para pessoas ou dependentes com transtorno do espectro autista (TEA). Assim, o trabalhador, ao se dirigir a uma agência da Caixa Econômica Federal, acaba tendo o seu pedido de liberação dos valores negado. Não se pode esquecer que o fim social do FGTS é o de proteger a dignidade humana, por isso, o entendimento do Poder Judiciário tem sido outro: o da liberação dos valores.

Para iniciar vamos conceituar o autismo como "uma disfunção neurológica de base orgânica, que afeta a sociabilidade, a linguagem, a capacidade lúdica e a comunicação" (Classificação Internacional de Doenças - CID 10, publicada pela Organização Mundial de Saúde).

HOJE, NO CENÁRIO ATUAL, AS INSTITUIÇÕES DO GOVERNO NÃO ESTÃO PREPARADAS PARA ASSISTENCIAR AS NECESSIDADES ESPECIAIS QUE NOSSOS FILHOS PRECISAM NO CUSTEIO DE TRATAMENTOS, MEDICAMENTOS, TERAPIAS QUE PRECISAM. ESSA PROPOSTA VISA ALTERAR AS LEIS SOBRE RETIRADA DO FGTS QUE É DIREITO DO TRABALHADOR.

Entendendo que se deve atender aos direitos fundamentais que são garantidos pelo ordem constitucional - direito à saúde, à vida e à dignidade humana -, a 3ª Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação para autorizar ao autor o saque total da conta do FGTS, determinando à CEF que proceda à liberação, para auxílio no tratamento de seu filho, que sofre de autismo associado a retardo mental. Votaram os Desembargadores Marga Barth Tessler e Carlos E. T. Flores Lenz. TRF da 4ªR., 3ªT., AC nº 2000.70.00.009822-1/PR, Relª. Juíza Taís Schilling Ferraz, Sessão do dia 30-04-2002, Inf. 116.

PARA CUSTEAR O TRATAMENTO DE NOSSOS FILHOS. ISSO É UM DIREITO A VIDA E PROPOEM A MELHORA DE VIDA PARA TAIS NECESSIDADES. TODOS PAIS SABEM QUE APOS O LAUDO DE TEA COMEÇA UM NOVO MARTIRIO EM BUSA DE INSTUTUIÇOES, TRATAMENTOS QUE NAO SAO NADA BARATOS! PARA ISSO CONTAMOS COM SUA AJUDA OPINANDO AQUI PARA TALVES MUDARMOS ESSA CONDIÇAO TAO INJUSTA A QUAL O GOVERNO NOS COLOCA DIANTE DE TAL DIFICULDADE.

O TEA - Transtorno do Espectro Autista envolve diversas patologias que prejudicam o desenvolvimento neurológico e apresentam três características: dificuldade de socialização, de comunicação e comportamentos repetitivos. Essas síndromes apresentam escalas de severidade e de prejuízos diversas. Dentre tais transtornos, o autismo é o que acomete mais os meninos e caracteriza-se, especialmente, pela inabilidade na interação social, como dificuldade em fazer amigos, em expressar emoções, podendo não responder a contato visual ou evitá-lo; dificuldade de comunicação eficiente e comprometimento da compreensão, além de prejuízos comportamentais, como movimentos repetitivos e diversas manias. Os primeiros sinais do autismo geralmente são observados pelo pediatra, que acompanha o desenvolvimento motor e cognitivo da criança. Após tal identificação, os pais são orientados a procurar um médico da área psiquiátrica ou neurológica para fazerem o diagnóstico. A partir daí estes profissionais prescrevem tratamentos que abrangem especialistas que trabalham em conjunto e com avaliações periódicas da criança e por um longo período. Os profissionais que habitualmente fazem parte dessa equipe multidisciplinar são o psiquiatra ou neurologista infantil, psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional.

A síndrome de Asperger é um estado do Transtorno do Espectro Autista, que acarreta uma dificuldade de adaptação funcional ao indivíduo ao meio social. Por muitos é considerado uma espécie de autismo leve. As pessoas acometidas pela síndrome de Asperger precisam de diversas terapias, que, como é de natural intuição, são caras. Por isso, a mãe de uma criança com síndrome de Asperger pediu, judicialmente, a liberação do saldo em conta de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, para fazer frente às inúmeras despesas. Ao contrário do que algumas pessoas costumam pensar, a síndrome de Asperger não é causada pela privação emocional ou por uma forma específica que os pais educam seus filhos. A causa do surgimento da síndrome de Asperger é desconhecida. Para que as pessoas acometidas da síndrome de Asperger possam ter uma melhor adaptação ao meio social precisam ser submetidas a inúmeras terapias para treinamento das habilidades sociais, educação especializada, terapia cognitiva e psicoterapia, terapia de interação sensorial, terapia de linguagem, equoterapia e inúmeras outras. A legislação de regência do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não prevê a hipótese de levantamento do saldo para pais de crianças com síndrome de Down, Paralisia Cerebral, Transtorno do Espectro Autista e síndrome de Asperger. O levantamento do saldo de FGTS, em tais hipóteses, infelizmente, somente se dá por meio de ordem judicial e foi exatamente o que aconteceu no caso em que se comenta. A Juíza Federal Sabrina Ferreira Alvarez de Moura Azevedo, acolhendo pedido formulado em ação movida pela mãe de uma criança com síndrome de Asperger, entendeu que a liberação do saldo contém um "elemento finalístico", qual seja, "auxiliar materialmente o titular da conta de FGTS "na hora em que, presumivelmente, mais precisa, em virtude de ele ou seus dependentes terem sido acometidos de doença grave".

Assim, como sempre a realidade chega ao Judiciário, sendo inconcebível que a Justiça se mantenha cega frente às necessidades e prioridades da população. Desta forma, são várias as decisões nos Tribunais do país concedendo o saque do FGTS para trabalhadores e pais de pessoas com autismo, garantindo que os direitos fundamentais elencados em nossa Constituição Federal sejam efetivamente desfrutados, respeitando sobretudo a dignidade da pessoa humana. Infelizmente não há a concessão administrativa, como ocorre para casos de neoplasias e HIV por exemplo, dependendo do ajuizamento de ação judicial. Mas, sem dúvidas, o trâmite deverá ser prioritário.

O tratamento da pessoa com autismo envolve uma série de terapias multidisciplinares, não raras vezes, extremamente caras. O julgador, ao perseguir o justo e o equitativo, não pode fechar os olhos para os casos que necessitam de proteção ao direito à vida e à saúde. É dever do Estado, consoante a Constituição obriga, que se adapte a letra fria da lei ao seu espírito, à luz dos direitos fundamentais nela assegurados. Cumpre ao Judiciário ampliar a incidência da norma, considerando que o processo moderno ordena que o julgador esteja atendo à dignidade da pessoa humana. O STJ já fixou entendimento que o art. 20 da Lei nº 8.036/1990 apresenta rol exemplificativo, por entender que não se poderia exigir do legislador a previsão de todas as situações fáticas ensejadoras de proteção ao trabalhador. Em suma, extrajudicialmente, infelizmente, o trabalhador não consegue a liberação dos valores. No entanto, judicialmente, são inúmeras as decisões dos tribunais determinando a liberação desses valores, tanto para os trabalhadores, quanto para pessoas com transtorno do espectro autista que sejam seus dependentes.

O fim social do FGTS de proteger a dignidade humana permite o saque do montante caso o beneficiário tenha dependentes que sofram de doença grave. Assim entendeu o juiz Luiz Henrique Horsth da Matta, da 4ª Vara Federal Cível no Espírito Santo, ao permitir o saque de R$ 156 mil do saldo da conta do FGTS de um trabalhador para custear o tratamento da filha. A menina é portadora de Síndrome de Down, autismo e transtorno alimentar. Numa primeira decisão, o magistrado negou o pedido por falta de comprovação das doenças e dos gastos. Após a apresentação dos documentos pelo trabalhador, representado pelo advogado David Metzker, o juiz reviu o próprio entendimento permitiu o saque. A decisão, segundo o juiz, é possível porque as limitações para saque impostas pela lei que rege o FGTS não impedem o Judiciário de fazer "interpretação mais abrangente, tendo em conta as particularidades de cada caso". Disse ainda que o acesso ao valor não pode ser garantido apenas "às doenças descritas no art. 20, da Lei 8.036/90, devendo ser contempladas também outras doenças de gravidade considerável, uma vez que o rol do mencionado dispositivo legal é meramente exemplificativo". O contexto do caso, devido às três doenças que necessitam de cuidados constantes, afirmou o magistrado, justifica a concessão. O magistrado destacou ainda que não há como condicionar o saque do saldo do FGTS ao valor do salário ou os gastos dos pais da menor." Isso porque o art. 20 da lei 8036/90, ao listar hipóteses de liberação de FGTS por doença grave, não faz qualquer exigência adicional ao próprio quadro de doença grave. Assim, não cabe ao intérprete fazê-lo. A determinação legal leva em conta apenas a gravidade do quadro médico para fins de liberação do FGTS", explicou. Mencionou ainda que "o valor depositado no FGTS pertence ao trabalhador e tem como fim uma utilização social, que preze pela dignidade humana", e que isso impede qualquer proibição ao acesso. "Justamente no momento em que necessita de recursos financeiros para proporcionar a continuidade do tratamento de saúde à sua filha, proporcionando a ela dignidade", finalizou.

A comunidade médica esclarece que o portador de autismo sofre de um distúrbio incurável, mas especialmente naqueles com grau leve, os sintomas podem ser substancialmente reduzidos caso recebam o tratamento adequado o mais cedo possível, proporcionando-lhe condições de conduzir a vida de forma mais próxima da normalidade. A lei 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros saúde, determina cobertura obrigatória para as doenças listadas na CID 10 - Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde, que trata-se de uma relação de enfermidades catalogadas e padronizadas pela Organização Mundial de Saúde. A CID 10, no capítulo V, prevê todos os tipos de Transtornos do Desenvolvimento Psicológico. Um destes é o Transtorno Global do Desenvolvimento, do qual o autismo é um subtipo. Da mesma forma, a lei 12.764 de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, "b" a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com autismo. Vale ainda mencionar os artigos 15 e 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem o direito ao respeito da dignidade da criança, bem como a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral. Fica claro, assim, que a legislação atual garante cobertura a diversos transtornos do desenvolvimento, inclusive ao autismo, e ao tratamento que o beneficiário do plano de saúde necessita, quais sejam, as sessões multidisciplinares de fisioterapia, psicologia, fonoaudiologia, dentre outras. No entanto, as operadoras e seguradoras de saúde limitam o acesso do beneficiário a apenas algumas sessões multidisciplinares anuais. Ocorre que referido tratamento demanda longo período de acompanhamento do paciente, sendo insuficiente a cobertura de apenas algumas sessões. O argumento utilizado pelas empresas de planos de saúde para tal restrição está no Rol da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, que determina a cobertura a poucas sessões de terapias. Ocorre que, conforme entendimento do Poder Judiciário, esse Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde não se trata de uma listagem taxativa, mas sim da cobertura mínima obrigatória que deve ser prestada pelos planos privados de assistência à saúde. Desta forma, tal argumento de seguir o que consta no referido rol da ANS não prevalece, eis que uma listagem emitida por órgão regulador não pode se sobrepor à lei 9.656/98, ou seja, não pode limitar o que a lei não restringiu. Não se olvide, ainda, que o médico é o responsável pela orientação terapêutica ao paciente, de forma que se a enfermidade necessita de tratamento prolongado e o profissional assistente não limitou a quantidade de terapias, não pode o plano de saúde pretender limitá-las. Nesse sentido, vale ressaltar o entendimento do STJ: "Ao prosseguir nesse raciocínio, conclui-se que somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acometeu o paciente. A seguradora não está habilitada, tampouco autorizada a limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do segurado, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor. Ora, a empresa não pode substituir-se aos médicos na opção terapêutica se a patologia está prevista no contrato.(...)Ao propor um seguro-saúde, a empresa privada está substituindo o Estado e assumindo perante o segurado as garantias previstas no texto constitucional. O argumento utilizado para atrair um maior número de segurados a aderirem ao contrato é o de que o sistema privado suprirá as falhas do sistema público, assegurando-lhes contra riscos e tutelando sua saúde de uma forma que o Estado não é capaz de cumprir. (REsp 1.053.810/SP - 3ª turma - Relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 17/12/09)"Importante mencionar, ainda, por analogia, a súmula 302 do STJ, que assim determina: "É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado". Ora, se nem mesmo os dias de internação podem ser limitados, o que gera muito mais despesas para as operadoras e seguradoras de planos de saúde, não há razão alguma para se limitar sessões relacionadas ao tratamento multidisciplinar do paciente autista. Necessário ressaltar que essa postura abusiva das empresas de planos de saúde tem sido repelida pelo Poder Judiciário, que tem deliberado em favor dos pacientes, a fim de obterem o tratamento médico adequado, sem limitação na quantidade de terapias necessárias. Portanto, qualquer restrição que se faça ao tratamento multidisciplinar necessitado pelo portador de transtorno do espectro do autismo se mostra abusiva, pois contraria a legislação vigente.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Dessa forma, fica claro que o Estado ainda esta a quem de atender as reais necessidades das pessoas portadoras do transtorno do espectro autista, contudo, a sociedade com muito esforço já escalou alguns degraus nessa luta diária e incessante para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas tão especiais. Por envolver uma questão de direito, o advogado devera ser consultado para analisar as provas (exames, laudos médicos, extratos do FGTS e etc.) e buscar a jurisprudência, doutrina e legislação pertinente ao tema, contribuindo no convencimento do julgador.

João Neto

Advogado

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FONTES:

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