PROBLEMA: Descontos indevidos em beneficio previdenciário pela Instituição Financeira.

24/08/2019

SOLUÇÃO: Recorrer a Justiça para solicitar a restituição do beneficio com pagamento dos danos sofridos.

Financeiras de crédito fazem novas vítimas a cada dia, aproveitando a fiscalização precária do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Aposentados estão sofrendo descontos mensais não autorizados que surgem nos seus contracheques a título de "seguros" que jamais contrataram.

O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem recebido um número cada vez maior de reclamações de aposentados e pensionistas por descontos indevidos em seus benefícios em nome de entidades que, muitas vezes, eles desconhecem. Segundo especialistas, cobrança feita sem autorização é prática de fraude.

Aposentados e pensionistas do INSS ou de regimes próprios devem dar bastante atenção ao seu contracheque. Inúmeras notícias são veiculadas sobre os descontos indevidos de associações em benefício previdenciário. A situação é tão comum que há um projeto de lei em andamento no Congresso Nacional (Projeto de Lei 5482/13) que pretende punir as entidades associativas ou sindicais que efetuam descontos sem autorização do associado. Dentre as punições, estão a multa de 50% sobre o valor arrecadado irregularmente e a restituição do mesmo valor, acrescido de correção monetária (INPC), multa de 2% e juros de 1% ao mês. Enquanto o projeto não é aprovado, o beneficiário deve se valer de outros meios para não ser prejudicado.

Um banco que fez descontos indevidos por três anos na aposentadoria de uma idosa foi condenado por má-fé. Na decisão, tomada pela 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, a instituição financeira foi obrigada a restituir em dobro os valores abatidos e a pagar indenização por danos morais de R$ 15 mil. Em primeiro grau, o banco também foi condenado. A sentença impôs a restituição dos valores e definiu indenização de R$ 5 mil. A ação foi movida pela aposentada depois que, após fazer um empréstimo, duas cobranças adicionais estavam sendo feitas sem que ela tivesse assinado nada além do que efetivamente tinha contratado junto ao banco. Ao TJ-SP, a autora da ação recorreu pedindo o aumento da indenização e também que o banco devolvesse os valores descontados em dobro. Para o relator do caso, desembargador Roberto Mac Cracken, o pedido mereceu deferimento porque "houve patente quebra do dever de boa-fé objetiva" pelo banco. "Uma vez que os dados pessoais da autora foram utilizados indevidamente para a vinculação a dois outros contratos de empréstimo, sem sua prévia informação e concordância", disse. A instituição, diz a decisão, já tinha sido informada sobre o problema e, inclusive, afirmou que havia sido de um erro, dizendo que iria corrigir o problema nas semanas seguintes. Mas nada foi feito. Segundo Mac Cracken, os descontos adicionais mais o contratado tomavam da autora 20% da sua renda mensal - um salário mínimo. Com isso, afetou a capacidade de subsistência da aposentada. "Tendo em vista que o Código Civil equipara o dolo à má-fé, ou seja, como contraponto da boa-fé, necessário reconhecer que o valor cobrado do consumidor em tal situação deve ser restituído em dobro", explicou o magistrado. Ele também criticou o banco pela maneira como se defendeu no processo, sequer apresentando cópias dos supostos contratos firmados que justificariam os descontos ou documentos confirmando que o crédito em questão foi repassado. "Não se pode dizer que um banco do porte do apelado, uma das maiores empresas financeiras do país, que, deliberadamente, age desprezando frontalmente o texto de lei, atua de boa-fé. Muito pelo contrário, atua com evidente má-fé", finalizou, determinando ainda que os autos fossem enviados ao Ministério Público para que a atuação do banco seja investigada.

A Previdência Social tem como objetivo assegurar aos seus beneficiários, mediante contribuição, meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente (artigo 1°).Dentre os benefícios concedidos pelo Instituto Nacional de Seguridade Social ("INSS"), órgão responsável pelo recebimento das contribuições e pagamento dos benefícios do regime geral de previdência social, está a aposentadoria, qualquer que seja sua modalidade (por exemplo, por invalidez, por idade, por tempo de contribuição e especial).Nos termos do artigo 115 da lei 8.213/91, são permitidos descontos na remuneração mensal da aposentadoria em determinados casos, a saber:(i) na hipótese de contribuições em atraso devidas pelo beneficiário; (ii) na hipótese de pagamento administrativo ou judicial de benefício que se provou indevido; (iii) para pagamento de imposto de renda retido na fonte; (iv) em função de decisão judicial obrigando ao pagamento de pensão alimentícia; (v) para pagamento de mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas; e (vi) para fins de pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil, até o limite de 35% do valor do benefício, sendo 5% destinados exclusivamente para: (a) amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou (b) utilização com a finalidade de saque por meio de cartão de crédito. Fazemos referência, no entanto, para a hipótese de desconto na remuneração mensal constante no item (v), isto é, para pagamento de mensalidades de associações e demais entidades de aposentados. Cresceram o número de denúncias envolvendo descontos indevidos na remuneração mensal dos aposentados para entidades que são por eles desconhecidas ou, ainda, por eles não autorizados os descontos, conforme determina a lei. Os descontos - independentemente do valor - só são válidos se houver a apresentação de documentos de identificação do aposentado, bem como assinatura de um formulário de autorização; caso contrário, permite o aposentado entrar com uma ação indenizatória na Justiça.

Pagamentos a sindicatos e associações estão previstas no artigo 115 da Lei nº 8.212/93, mas, para que as transferências sejam feitas, o aposentado precisa assinar um formulário de autorização. Os descontos podem ser de até 5% do benefício. Ao Correio, quatro segurados do INSS denunciaram a Associação Nacional de Aposentados e Pensionistas da Previdência Social (Anapps), que, segundo eles, realizou descontos sem aval prévio.

A juíza Candice Arruda de Vasconcelos, titular da Vara Única da Comarca de Ubajara (distante 329 km de Fortaleza), condenou o Banco Votorantim a pagar R$ 8 mil para a aposentada L.S.C. O valor é referente à indenização dos danos morais causados por descontos indevidos. Segundos os autos, a idosa percebeu redução mensal no benefício previdenciário. Ela foi a uma agência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e pediu o histórico de consignação. Constatou que os débitos eram relativos a empréstimos que ela não havia feito. A aposentada tentou resolver o problema administrativamente, mas não obteve resultado. Em novembro do ano passado, entrou com ação na Justiça, requerendo a devolução, em dobro, dos valores descontados indevidamente e indenização por danos morais. O Banco Votorantim não se manifestou e foi julgado à revelia. Na sentença, a juíza determinou a devolução, em dobro, das quantias debitadas e o pagamento de R$ 8 mil, a título de reparação moral. A magistrada afirmou que "as provas constantes dos autos confirmam os descontos alegados pela autora [aposentada], sem que, entretanto, tenha efetivamente recebido os valores referentes ao empréstimo". A decisão foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico.

Há consenso entre especialistas de que o acesso ao sistema do INSS é muito vulnerável. O vice-presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB/DF, Diego Cherulli, disse que as informações dos segurados "circulam bastante" por meio de corrupção de servidores públicos que têm acesso aos dados. "Os próprios bancos recebem informações sobre aposentadorias e cadastros muito antes de a pessoa saber, o que torna muito mais fácil de vazar", destacou. A presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Adriane Bramante, destacou que esses descontos são "absurdos" e não podem acontecer. "Mas ocorrem, e muito. Em vários casos, a pessoa mais humilde nem sabe que está sendo cobrada, porque não tem acesso à internet e não acompanha o extrato", destacou. "Percebemos que isso está acontecendo de forma recorrente, em quantidade muito maior do que é levado à Justiça", completou. Segundo a ex-servidora Eliana Alves Takahama, 57 anos, a Central Nacional dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (Centrape) realizou descontos em sua aposentadoria sem autorização. "Eu entrei no meu extrato na internet para saber do que se tratava, porque não conhecia essa entidade. Nunca autorizei nenhum desconto", contou. Ela disse que só recebeu o estorno depois de pressioná-los. O INSS informou que, para excluir o pagamento, o segurado pode fazer um requerimento em qualquer agência da autarquia ou diretamente no sindicato ou associação à qual é filiado. Caso se sinta prejudicado, deve procurar a ouvidoria do órgão, pelo portal do INSS ou pelo telefone 135. Adriane, do IBDP, acrescentou que, se quiser entrar na Justiça, é recomendável que a pessoa procure a associação e solicite o contrato que permitiu os descontos em sua aposentadoria ou pensão. "Como a entidade não terá o documento, o aposentado terá condições de cobrar reembolso e acionar o Judiciário." O segurado pode solicitar os pagamentos com juros e correção monetária.

A 26ª câmara Cível do TJ/RJ confirmou sentença que julgou procedente pedido de aposentado para ser indenizado por dano moral e ter restituído, em dobro, valor indevidamente descontado de seu benefício previdenciário. O caso tratou de suposta falha na prestação de serviço por descontos relativos a diversas associações na conta do aposentado. Ao analisar o apelo da instituição financeira, o desembargador Arthur Narciso de Oliveira Neto, relator, destacou que não houve simples envio de cobrança para a residência do consumidor, mas o desfalque, em seus proventos, de quantia indevida. "Cabia ao quarto Reclamado [associação] demonstrar a autenticidade do contrato, a origem da dívida e a licitude da cobrança, corroborando a falha na prestação do serviço, não podendo ser imputado ao consumidor o ônus de provar fato negativo." Já o banco, entendeu o relator, não se desincumbiu do ônus probatório, e portanto entendeu clara a falha na prestação do serviço, cabendo responsabilização pelos danos causados, devendo ser restituídos os valores descontados indevidamente.Com relação ao dano moral, o desembargador observou que os fatos geraram constrangimentos: "A compensação deve ser proporcional à dor sofrida pelo Demandante, idoso, aposentado pela Previdência Social." O valor fixado em 1º grau de R$ 15 mil foi considerado adequado pelo relator da apelação. A decisão da Câmara foi unânime.

É muito comum que aposentados e pensionistas contratem empréstimos consignados, cartão de crédito consignado, financiamentos, seguros, dentre outros produtos e serviços. Em casos como esses, os contratos podem prever o desconto direto no contracheque. Ao assinar o contrato e estabelecer a relação com a instituição, o beneficiário concorda com tal desconto. Quando o comprometimento da renda está dentro dos limites legais, não há qualquer problema nessa relação. Recomenda-se que o consumidor fique atento para não se endividar, indo além da sua capacidade. Entretanto, há situações em que os descontos não são autorizados.

Comete ilícito o estabelecimento bancário que procede a descontos mensais em proventos de aposentadoria de cliente, sem autorização e sem prova do empréstimo consignado. Com esse entendimento, a 6ª Câmara de Direito Civil deu provimento ao recurso de uma idosa que teve descontadas mensalmente, na folha de pagamento, parcelas de empréstimo que não contratara. A decisão fixou danos morais de R$ 5 mil. Em 1º grau, já havia sido concedida a reversão do desconto não autorizado.No ano de 2011, a apelante contratou empréstimo no valor de R$ 4,8 mil, a ser pago em 60 prestações de R$ 80. Assim que pagou a 17ª prestação, ela contraiu novo empréstimo de R$ 2,3 mil para "refinanciar" o contrato anterior. O banco passou a descontar parcelas de R$ 76, porém continuou a debitar as de R$ 80. Em sua defesa, afirmou que estas eram lícitas, pelo valor acumulado ter sido combinado por mais 60 meses. Em apelação, a idosa sustentou que o desconto indevido acarretou-lhe danos de ordem moral, já que é pessoa pobre, idosa e que recebe proventos do INSS. O relator, desembargador Monteiro Rocha, concluiu que o banco não provou a origem dos dois descontos de forma acumulada e que se limitou a trazer aos autos contrato adesivo, mas nada acerca dos descontos questionados pela autora. "Outrossim, malgrado a autora tenha contraído diversos empréstimos consignados com a instituição ré, não há elementos probatórios que deem supedâneo à licitude da cobrança do valor impugnado [...]", complementou Rocha. A decisão foi unânime (Apelação n. 0020096-86.2011.8.24.0008).

Muitos beneficiários de previdência estão sofrendo descontos indevidos de associações. Na verdade, eles sequer sabem que estão pagando essas contribuições, já que as entidades associativas atuam de forma obscura. Algumas associações também lançam descontos de seguros de vida, fazendo com o beneficiário acredite realmente estar sendo beneficiado. Em comum, o valor é relativamente pequeno, varia entre R$10,00 e R$50,00.Em suma, elas descontam um valor nos proventos beneficiários direto no contracheque do aposentado ou pensionista. Portanto, se o beneficiário confere o recebimento somente em sua conta bancária, dificilmente perceberá que está sendo lesado. Ao solicitar esclarecimentos às associações, o beneficiário é informado que o valor se refere a inclusão no plano familiar, que fornece assistências 24 horas, redes de desconto em produtos e serviços, assistência funeral, seguros ou coisas do tipo. Entretanto, se não autorizados, são descontos indevidos de associações em benefício previdenciário. A entidade só poderia efetuá-los se o beneficiário efetivamente formalizasse a contratação, autorizando o desconto. Apesar de ser um valor pequeno, ele pode ser muito relevante para aqueles que percebem um salário mínimo de provento. Os prejuízos ao beneficiário não podem subsistir diante da ilegalidade da conduta.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: O primeiro passo é procurar o canal de atendimento da instituição que está se beneficiando do desconto. Geralmente, são serviços de call center. O lesado pode requerer o cancelamento do produto - seja seguro ou assemelhado - e a restituição do dinheiro. Caso não consiga resolver o problema com a seguradora, o aposentado pode procurar um advogado para ingressar com ação judicial requerendo o fim das cobranças, a devolução dos valores descontados e eventual dano. As vítimas dos descontos indevidos de associações em benefício previdenciário devem reportar a situação à entidade para tentar resolver a questão administrativamente, solicitando a restituição daquilo que já foi cobrado, bem como a imediata suspensão de novas cobranças. Quando isso não acontecer, o recomendado é procurar um advogado qualificado para ajuizar uma ação capaz de fazer cessar essas contribuições que não foram autorizadas, de devolver os valores pagos indevidamente, de declarar que não há débito e de reparar os possíveis danos causados. Essa ação é chamada de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais e materiais. O advogado responsável anexará os contracheques para comprovar o desconto. Do outro lado, caberá à associação comprovar que de fato houve contratação. Como não há uma relação associativa, a situação se configura como uma relação de consumo, devendo incidir as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC).Há, assim, evidente falha de prestação do serviço. O pedido de suspensão dos descontos deverá ser acompanhado de multa diária, para o caso de descumprimento. Sendo assim, esse tipo de cobrança sem relação jurídica não pode ser considerada engano justificável, sendo que o valores eventualmente cobrados devem ser restituídos em dobro, com base no artigo 42, parágrafo único, do CDC. A apropriação indevida de verba alimentar ofende o direito de subsistência do beneficiário, o que, conforme entendimento já sedimentado na jurisprudência, faz presumir a existência do dano moral. Em situações similares, a Justiça tem arbitrado indenizações entre R$5 e R$20 mil reais, dependendo das circunstâncias do caso concreto e do entendimento do órgão julgador.

João Neto

Advogado

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FONTES:

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