PROBLEMA: COMPRADORES DE IMÓVEIS NA PLANTA REALIZAM DISTRATO COM AS INCORPORADORAS, COM 90% DO PAGAMENTO JÁ EFETUADO.
SOLUÇÃO: O CONSUMIDOR PODE PEDIR A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS À JUSTIÇA EM RAZÃO DO DESFAZIMENTO DA NEGOCIAÇÃO.
Um dos desafios de quem opta por comprar imóvel na planta é aguardar o término da construção. A demora geralmente resulta em alteração da situação econômica do comprador, que corre o risco de não ter o financiamento bancário aprovado. Como agravante a correção monetária do saldo devedor do imóvel pelos índices de construção civil (INCC) acaba por tornar onerosa a aquisição. Muitos perdem o interesse ou a capacidade de comprar o imóvel e pensam seriamente em desistir do contrato.
A discussão sobre o valor a ser restituído aos compradores de imóveis na planta, que tenham desistido da compra, tem levado cada vez mais consumidores e construtoras à justiça. A discordância é motivada pelo abuso das construtoras que quase, invariavelmente, retém montantes superiores 20% do valor pago.
Apesar de estar em pauta, pelo menos, desde 2015, quando o senador Romero Jucá (PMDB-RR) encaminhou o Projeto de Lei (PL) 774 em que regulamentava a situação, o debate se arrasta, principalmente, pela divergência nos interesses de construtoras e órgãos de defesa do consumidor. Apesar de concordarem que regras precisam ser definidas, para dar uma maior segurança jurídica, os dois lados permanecem em um impasse, pois discordam do valor que o consumidor deve receber de volta caso desista da compra.
O contrato de incorporação imobiliária é um contrato de consumo e, como tal, submete-se aos preceitos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), também regulado por lei especial, a Lei 4.591/64, a qual representou um grande avanço para a regulação no setor imobiliário na época, ao tratar do tema da promessa de compra e venda e da incorporação como forma de facilitar o acesso à casa própria enquanto desejo a ser perseguido pela maioria da população brasileira. Mas, ao contrário do que pode parecer, a lei especial de 1964 não regulou o tema do distrato. Esse tema continua em debate no meio jurídico, tendo como pano de fundo a denominada "crise do setor imobiliário", pois, com o superendividamento dos consumidores, desemprego em alta e o contexto de crise econômica vivenciada pelo país nestes últimos anos, muitos consumidores enfrentam a dura realidade de ter que devolver os imóveis.
Mensalmente, o número de clientes que adquiriram imóveis na planta e, por inúmeros motivos, procuram a construtora para rescisão desses contratos só aumenta. Seja por dificuldades financeiras, seja por atraso na entrega da unidade, ou ainda por limitações ao acesso do crédito imobiliário, o chamado "distrato" se tornou presente no dia a dia da população brasileira.
Decisão de um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisões de outras instâncias judiciais que garantiram a devolução ao comprador de 90% do valor pago por um apartamento em razão da rescisão do contrato de compra com a construtora (distrato).
A defesa tem como base o código de defesa do consumidor e as sucessivas decisões da Justiça nesse sentido. Os juízes têm entendido que cabe uma multa de entre 10% a 15% do valor pago à construtora até o momento do rompimento do negócio. O governo do presidente Michel Temer já anunciou que pretende regulamentar a questão. Porém, até agora, apesar de terem sido feitas reuniões, nada foi decidido.
O Poder Judiciário tem reiteradamente entendido como justa a retenção em benefício da construtora de 10% a 25% dos valores investidos para ressarcimento de despesas e como penalidade ao desistente. Os 75% a 90% restantes deverão ser devolvidos ao consumidor, com correção monetária e juros.
O percentual de 10% mostra-se ser suficiente para cobrir as despesas administrativas, até porque as construtoras não têm comprovando desembolso maior para realização da venda. Entretanto, prejuízos relativos ao impedimento de negociação, em razão da propriedade ter se mantido com o comprador, essa varia de caso a caso, considerando-se o período transcorrido, bem como a valorização do imóvel, de acordo com a especialista.
Apesar de a regulamentação parecer caminhar mais para o que já vem sendo aplicado pelo Judiciário, outras alternativas não são descartadas, o que também tem travado o avanço nas conversas. A principal delas é que 10% do valor do imóvel seja retido em caso de distrato. Se no momento da desistência o valor for inferior aos 10%, então 90% do que foi pago pelo consumidor ficaria para a empresa.
É preciso pontuar que o artigo 53 do CDC veda cláusulas de decaimento, em que o consumidor perde todos (ou quase todos) os valores pagos para aquisição da casa própria, como a proposta em discussão pelo setor representante das construtoras/incorporadoras. A análise do discurso a respeito da necessidade de regular o distrato deve iniciar pelo questionamento do verdadeiro sentido de se considerar irretratável o contrato de aquisição de propriedade por incorporação imobiliária na Lei 4.591/64, bem como da suposta insegurança jurídica que o desfazimento desses contratos estaria gerando no seio social. O escopo da lei da década de 1960, como se observa na leitura de seus dispositivos, foi a proteção do adquirente-consumidor, trazendo, como decorrência, uma série de artigos a respeito da necessidade de registro do incorporador e transparência na consecução de seus negócios.
Recentemente, três casos chamaram nossa atenção, pelo absurdo ocorrido. No primeiro deles, o adquirente pagou até o momento R$ 34 mil reais à construtora (além das taxas de corretagem) ;e ao informar que sua realidade financeira estava complicadíssima e não conseguiria prosseguir com a compra de um apartamento na planta, foi surpreendido com a resposta que, além de perder o valor integral que havia pago até aquele momento, ainda estaria devendo mais R$ 9 mil reais em razão do distrato, de acordo com as multas e sanções contratuais.
O consumidor pode pedir o distrato do imóvel até a entrega das chaves.
Em primeiro lugar, a construtora ou incorporadora, para manifestar seu interesse em desfazer a venda. Para fazer o distrato, o consumidor deve fazer uma solicitação por escrito, dizendo que tem interesse em desistir do negócio, e protocolar esse documento junto à construtora, solicitando um prazo para que ela se manifeste.
A lei não determina o porcentual que o consumidor irá receber de volta quando pede o distrato. Mas, em decisões judiciais, os consumidores têm conseguido garantir entre 85% e 90% dos valores pagos até o momento da desistência da compra, corrigidos pela inflação e em parcela única. Porém, se o motivo do distrato for o não cumprimento do contrato por parte da construtora, o consumidor tem o direito de recuperar tudo o que já pagou.
Isso porque, apesar das construtoras invocarem as "cláusulas contratuais", devemos lembrar que esse contrato foi redigido exclusivamente pela construtora, de forma unilateral e leonina.
ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Outra situação comum é a construtora propor a devolução do crédito do consumidor de forma parcelada. Geralmente querem devolver no mesmo número de parcelas pagas pelo comprador, forma de pagamento essa na maioria das vezes prevista no contrato. O Poder Judiciário tem decidido que o crédito do consumidor deverá ser devolvido em uma única parcela a ser paga no momento da rescisão contratual. É claro que mesmo a legislação prevendo o direito do consumidor ao reembolso significativo do que pagou na hipótese de desistência da compra de imóvel na planta, as construtoras comumente causam muito impasse e negam o reembolso. Por vezes até fazem ameaças de que ingressarão com ação judicial indenizatória contra o consumidor. Nesta hipótese não restará ao comprador alternativa senão buscar auxilio de um operador de direito e ingressar com ação judicial para ressarcimento do valor pago e dos danos suportados. Por esse motivo, é importante que o consumidor tenha consciência de que suas condições pessoais e financeiras podem mudar até a efetiva entrega das chaves. Preventivamente, é prudente considerar as condições contratuais para eventual desistência antes mesmo de assinar a promessa de venda e compra. Já no início das negociações poderá exigir a alteração das cláusulas contratuais abusivas, que estabeleçam a retenção integral do que pagou na hipótese de desistência, negociando condições mais favoráveis e que tornem o processo de distrato mais simples. Lembre-se que há assessoria jurídica disponível que pode e deve ser consultada preventivamente antes da assinatura de qualquer contrato ou proposta. Leve em conta que comprar um imóvel é investimento de alto custo, que exige planejamento de médio a longo prazo, sendo prudente buscar a maior quantidade de informação jurídica possível.
João Neto
Advogado
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FONTES:
https://exame.abril.com.br/negocios/dino/distrato-de-compra-de-imovel-na-planta-um-direito-do-comprador-dino89092707131/
https://www.segs.com.br/seguros/3597-justica-garante-devolucao-de-ate-90-do-valor-pago-em-imovel-na-planta-em-caso-de-distrato.html
https://www.gazetadopovo.com.br/economia/debate-sobre-regras-para-desistencia-da-compra-de-imovel-na-planta-se-arrasta-3j7ghe50hipt9xwilmqqb38k5
https://www.direitoeconsumo.adv.br/imovel-na-planta-direitos-comprador-que-desiste-do-contrato/
https://www.conjur.com.br/2017-mar-01/garantias-consumo-novas-regras-distrato-contratos-imoveis-planta
https://www.stj.jus.br/sites/v/index.jsp?vgnextoid=8bcf2726f6e12510VgnVCM1000008c000c0aRCRD
https://epocanegocios.globo.com/colunas/Financas-de-Bolso/noticia/2017/02/desistiu-da-compra-do-imovel-saiba-seus-direitos-em-caso-de-distrato.html