PROBLEMA: Avarias provocadas em bens transportados por empresa especializada.

27/04/2019

SOLUÇÃO: Transportadora deve pagar indenização pelos prejuízos sofríveis pelo contratante.

É altíssimo no Brasil o percentual de cargas roubadas. Os números facilmente atingem a casa dos bilhões de reais. O Brasil, com sua dimensão continental, conta primordialmente com o transporte rodoviário para transportar sua produção. O transporte ferroviário é escasso, e o marítimo é utilizado, em grande parte, para a exportação de bens. As cargas são transportadas em rodovias, pelas próprias empresas produtoras ou por empresas especializadas, para tanto contratadas. Dessa atividade surgem danos, que podem empenhar responsabilidade civil.

Além do transporte de pessoas, a responsabilidade civil do transportador aplica-se ao transporte de coisas (bagagens, encomendas, produtos). Desta forma, o Contrato de Transporte deve abranger, além da segurança na contratação do serviço (proteção à integridade do consumidor), a obrigação do transporte de sua bagagem, seja no compartimento em que o passageiro irá viajar, ou em local apropriado para o devido despacho da bagagem. Deve o transportador fornecer um comprovante de bagagem, para que o passageiro, ao chegar ao seu destino, possa retirá-la. Conforme preceitua o artigo 734 do Código Civil Brasileiro: "O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade." Nesse contexto, no momento em que o viajante compra a sua passagem, recebe o direito ao transporte de sua bagagem, e, caso esta apresentar excesso de peso, poderá ser cobrado um acréscimo por sobrepeso. No caso de extravio de bagagem, a indenização que vem sendo aplicada é de até dois salários mínimos, exigindo-se, declaração do excesso do valor dos bens. O Código de Defesa do Consumidor, que prevê a inversão do ônus da prova, como forma de proteger o consumidor, não havendo no referido diploma legal a tarifação da indenização, entendendo que a mesma deve ser completa, caso haja prova dos valores transportados na bagagem. O transporte de bagagens é uma relação de consumo abrangido pelo Código de Defesa do Consumidor, no caso de algum dano causado ao consumidor em relação a seus pertences pelo transportador, e que devidamente comprovada a culpabilidade ensejará ao mesmo o dever de reparar o dano.

Nas palavras do i. Silvo de Salvo Venosa, "o homem, desde a Antiguidade sempre teve a necessidade de deslocar-se, bem como de deslocar suas coisas". Porém, para que o homem a comercialize, exporte e importe, é preciso uma atividade de deslocamento dessas coisas, que se faz viável através dos transportes. Desse modo, é preciso que determinada pessoa se comprometa a levar a mercadoria a um destino, seja por meio aéreo, marítimo ou terrestre e, que tal comprometimento se dê através de um contrato. Ocorre que, esses meios de transportes podem apresentar problemas, pois dependem de aeronaves, navios, rodovias, segurança, condições climáticas, etc., ensejando, assim, na responsabilidade civil dos transportes. O contrato de transporte caracteriza-se como um contrato de resultado, à medida que incumbe ao transportador levar a mercadoria até seu lugar de destino em segurança, tomando todas as cautelas necessárias para "mantê-la em bom estado e entregá-la no prazo ajustado ou previsto", conforme o art. 749 do Código Civil e, caso contrário, pode-se ensejar a responsabilidade civil do transportador.

Inobstante extensa polêmica que permeia a temática, destacam-se entendimentos jurisprudenciais e doutrinários que consideram admissível a incidência do CDC nos contratos de transporte marítimo. A especificidade fundamental dos contratos remete a análise diferenciada da incidência do Código de Defesa do Consumidor (CDC) nos respectivos contratos. Destarte, a definição e exata configuração da relação de consumo é fundamental para evidenciar a aplicabilidade do CDC no contrato de transporte e de fretamento marítimo.Com efeito, o transportador marítimo ou o fretador seriam enquadráveis como fornecedor, nos exatos termos do art. 3º do CDC e o transporte marítimo, a priori, enquadrável como serviço, nos termos parágrafo segundo do mesmo artigo. A grande complexidade, contudo, refere-se ao conceito de consumidor e a exegese de destinatário final. .Consumidor, consoante conceito esposado no CDC, art. 2º, ´toda a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Dessume-se pela exegese do art. 2º do CDC, que o conceito de consumidor é econômico. A expressão destinatário final objetiva demonstrar que a relação entre as partes não faz parte da cadeia de produção. Todavia, a redação do art. 2º do CDC engendra dificuldades de hermenêutica. A priori, portanto, seria admissível enquadrar, no conceito de consumidor, as empresas que utilizam os serviços de transporte, sob a égide do art. 2º da legislação consumeirista. Consoante análise consolidada, no transporte de passageiros, é praticamente unâmime o entendimento que propugna pelo influxo do CDC nos contratos de transporte. Todavia, a mesma unanimidade já não se detecta no que concerne aos contratos de transporte marítimo de mercadorias. [1]Em seara de contrato de fretamento marítimo, entende-se admissível o influxo do CDC, consoante argumentos a seguir esposados. Atente-se, contudo, para a detecção de divergências doutrinárias e jurisprudências que engendram exegeses diferenciadas do enquadramento da relação de consumo nos contratos de transporte marítimos, destacando-se as teorias finalista e a teoria maximalista, adiante analisadas, que divergem, essecialmente, sobre a exata abrangência do conceito de consumidor e destinatário final. No que tange ao enquadramento da incidência específica ao contrato de fretamento marítimo, face a confusão exegética que deflui do tema e da própria normativa, não são detectadas análises específicas a respeito, contudo pretende-se, no estudo em questão, afastar a possibilidade da incidência.

O seguro de transportes abrange duas categorias: a de transportes propriamente ditas, contratada pelo vendedor ou pelo comprador da carga e a de responsabilidade civil, contratada pelo transportador. A primeira delas se divide em transportes nacionais (mercado interno) e transportes internacionais (exportação e importação). A segunda categoria, de responsabilidade civil, por sua vez, possui vários tipos de seguros que garantem ao transportador o reembolso de indenizações que ele seja obrigado a pagar para reparar danos à carga que transportava. Tanto em transportes nacionais como em internacionais, o seguro cobre prejuízos causados a bens e mercadorias em viagens sobre a água, vias terrestres (rodoviárias e ferroviárias) e aéreas, ou em percursos que utilizam mais de um meio de transporte, chamado multimodal.

Juiz do 1º Juizado Especial Cível de Taguatinga julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para condenar a Transportes Gerais Botafogo LTDA a pagar ao autor, a título de danos materiais, a quantia de R$ 2.698,99 pelas avarias provocadas em bens transportados pela empresa e, ainda, condenar a transportadora ao pagamento de indenização, a título de danos morais, no valor de R$ 1 mil. O autor alega a existência de vícios nos serviços de transporte de carga prestados pela Transportes Gerais Botafogo LTDA, consistentes nas avarias provocadas em uma geladeira e uma luminária transportadas pela empresa. Assim, pediu a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 2.700,00, bem como indenização por danos morais, em valor a ser arbitrado pelo Juízo. Em contestação, a Transportes Gerais Botafogo LTDA defende que os danos materiais ocasionados ao autor equivalem a apenas R$ 500,00. Refuta o pedido de danos morais e pede pela improcedência dos pedidos. Para o juiz, a existência dos vícios nos serviços prestados pela transportadora constitui fato incontroverso, diante do reconhecimento na contestação. As partes divergem apenas quanto ao valor da indenização a ser paga pela empresa em virtude das avarias que provocou na geladeira e na luminária do autor. Os orçamentos apresentados pelo autor comprovam que os valores de mercado da luminária e da geladeira danificadas pela transportadora são de, respectivamente, R$ 399,99 e R$ 2.299,00, totalizando um prejuízo de R$ 2.698,99. Embora os valores pleiteados na inicial tenham sido impugnados pela ré, esta não apresentou documentos capazes de contestar as provas produzidas pelo autor. Logo, deverá a Transportes Gerais Botafogo LTDA indenizar o autor pelos danos materiais que suportou, no valor total de R$ 2.698,99. Ademais, "tenho como suficiente à subsunção do conceito de ato ilícito o fato de o consumidor ter sido submetido a verdadeira peregrinação em face da conduta da transportadora que, mesmo reconhecendo que danificou a geladeira e a luminária do autor, não se dignou a providenciar o ressarcimento do seu prejuízo, muito provavelmente na expectativa de que eventual demanda judicial redundaria tão somente na determinação da reparação material", afirmou o magistrado. Desta forma, segundo o juiz, a indenização por danos morais objetivada mostrou-se cabível. "São inegáveis os constrangimentos e os sentimentos de aflição e angústia experimentados por quem tem seus bens danificados pela transportadora e é tratado com descaso por aquela que deveria, prontamente, apresentar solução para o problema", afirmou. Assim, impondo-se à ré o dever de indenizar o autor pelos dissabores experimentados, o juiz determinou o pagamento de R$ 1mil de indenização por danos morais.

Na prática, as mercadorias transportadas por quaisquer meios de transporte devem ter a proteção de dois seguros:• de transporte, com contratação facultativa por parte do dono da carga para garantir os bens e• de responsabilidade civil, de contratação obrigatória por parte do transportador para garantir o compromisso de recebimento e entrega da carga.

Segundo Maria Helena Diniz, quando houver obrigação civil, haverá uma ligação jurídica entre as partes, na qual uma delas deverá realizar alguma prestação à outra (devedor e credor, respectivamente). Caso não ocorra a realização de determinada obrigação, o credor, que possui um vínculo jurídico com o devedor, pode recorrer ao Poder Judiciário para que tenha seu direito preservado. Ainda nas palavras da ilustre professora, existem as obrigações empresariais, o que nos leva à questão da Responsabilidade Civil no Transporte de Cargas, pois esta obrigação se dá não só pela atividade empresarial, mas também da circulação de bens e produtos. Desse modo, o artigo 369 do Código Civil, trata da questão da compensação. Realizando uma análise de tal artigo, para que seja admitida a compensação, a dívida deve se das por coisa fungível, ser líquida e vencida. No caso dos contratos de transportes, a dívida passa a ser líquida, quando uma das partes deixa de cumprir com o quanto contratado, como a não entrega de mercadoria, ou o não pagamento pelo serviço realizado. Passa a ser vencida com o não cumprimento dentro do prazo, ou simplesmente o não cumprimento do acordado; e de coisa fungível, ou seja, que pode ser substituída por outra coisa de mesma espécie, qualidade e quantidade, como por exemplo, o dinheiro, que pode ser substituído por outras notas, os cereais, que podem ser substituídos, como o trigo, e até mesmo um vinho, no qual a garrafa pode ser substituída por outra, de igual qualidade. Logo, evidente, que o contrato de transporte pode ser executado, e caso seja necessário, pode-se pedir a compensação. Com a elaboração de um contrato, pode-se adicionar cláusula que exonerem uma das partes com relação à indenização ou com relação à responsabilidade da parte, tais como caso fortuito e força maior, culpa de terceiros. Segundo Sílvio de Salvo Venosa, o melhor termo para uma cláusula de um destes tipos em um contrato, seria a de indenização, pois, não exonera a parte de culpa, mas sim do dever de indenizar. Existe uma discussão doutrinária quanto à validade deste tipo de cláusula, onde a discussão gira em torno da questão da imoralidade e esta ser contrária ao interesse social, visão esta reforçada pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 51, inciso I, que diz: "Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; (grifos nossos)".Observando o final do primeiro inciso, nota-se que nos casos de pessoas jurídicas, entende-se que existe a possibilidade de indenização, mas "em situações justificáveis", o que leva a entender que nas relações comerciais entre pessoas jurídicas, este tipo de cláusula não teria validade, dependendo do caso e da situação. Reforçando esta tese, temos a Súmula 161 do STF, onde, nos contratos de transporte, mesmo que constem esta cláusula, ela é inadmissível: "Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar". O Código Civil em seu artigo 730, trata da obrigação convencionada entre as partes, tanto na questão de transporte de pessoas (consumidor final), quando na questão de produtos. Ainda, no artigo 732, também do Código Civil, é levantada a questão da aplicabilidade dos contratos de transporte, mencionando quesitos de admissibilidade, como tratados e convenções internacionais ou legislação específica, apresentadas como normas de hermenêutica jurídica, instituídas como fontes suplementares ou subsidiárias de normas.

ACOMPANHAMENTO PROFISSIONAL: Reconhecida a culpa da transportadora pela falta de cuidado na proteção da carga, ensejando a ocorrência de sua subtração, não é caso de reconhecer-se a isenção fundada em força maior, isto é, é dever legal da transportadora zelar pela segurança do carregamento. Se o motorista de caminhão, transportando carga de terceiro, para o veículo desnecessariamente, em área sujeita a assaltos, o respeito proprietário responde pela negligência do preposto. É comum que as cargas transportadas sejam seguradas, ou seja, que se realize, em relação a elas, contrato de seguro, precavendo-se a empresa transportadora contra os riscos próprios desse tipo de transporte. Nessa hipótese, havendo roubo - e não configurando caso fortuito ou força maior -, a empresa transportadora deverá indenizar o proprietário da carga. Somente após isso poderá, em regresso, cobrar da seguradora. É como vem decidindo a jurisprudência. Logo, é de extrema importância consultar um advogado para confeccionar contrato de transporte, bem como o de seguro e analisar tais documentos, para viabilizar a devida indenização (ou não) sobre os prejuízos das partes.

João Neto

Advogado

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FONTES:

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